Chile - Os mil cenários de um país

Apertado entre o Pacífico e os Andes, o território chileno vai do deserto de Atacama à gelada Patagônia, revelando lagos belíssimos, estações de esqui e cidades hospitaleiras.


Entre os motivos que levaram os chilenos a ser considerados "os ingleses da Amárica Latina" estão a maneira reservada como vivem e o jeito formal - embora cavalhereisco - com que costumam receber os visitantes.
Quando são apresentados a brasileiros, porém, a regra é outra. Na maioria das vezes, são eles que se encarregam de quebrar o gelo com algum comentário sobre as nossas belas praias ou o futebol. Nesse caso, se quiser ganhar um amigo, dê corda à conversa e convide para um pisco sour. O drinque, preparado com destilado de uva típico do Chile e do Peru, leva suco de limão, açúcar, gelo (que, depois de amaciar a aguardente, é coado) e clara de ovo. E é a senha para quem, além dos muitos atrativos naturais do país, também quer conhecer um pouco da sua alma.


Numa rodada de pisco é fácil ver que, por trás de um chileno sisudo, há sempre um brincalhão em potencial. Os motoristas de táxi, por exemplo, que vivem sob a fiscalização dos implacáveis carabineros (os policiais de elite encarregados da repressão política na época da ditadura, hoje mais dedicados ao controle do trânsito e ao combate aos batedores de carteira) sentem-se vingados ao repetir baixinho, a frase "Donde hay Paco, hay taco", em cada sinal fechado. Como Paco é o apelido, um tanto depreciativo, do carabinero, e taco quer dizer engarrafamento, eles querem dizer que os policiais estão ali não para melhorar o fluxo de automóveis, mas para complicá-lo. 


Vicente Huidobro, poeta chileno que se destacou na primeira metade do século tanto pela qualidade dos seus versos quanto pela irreverência, também encontrou a melhor definição geográfica para o Chile num jogo de palavras. Costumava dizer que em sua terra os quatro pontos cardeais na verdade são três: o norte e o sul. É uma frase de efeito poderosa, auto-explicativa, e basta dar uma olhada no mapa para perceber isso.


No sentido norte- sul, o Chile é um país tão extenso quanto o Brasil. Mede perto de 4 300 quilômetros de um extremo a outro, em linha reta, atravessando 38 paralelos, superando ligeiramente a distância que separa o Oiapoque do Chuí. De leste a oeste, ao contrário, aparece espremido entre o Oceano Pacífico e as fronteiras com a Argentina e a Bolívia, acomodando-se num corredor apertado com largura média de apenas 250 quiolômetros, pouco mais do que a metdade do percurso entre as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. Esse formato extravagante, porém, que garante ao país o título informal de território mais comprido (ou mais estreito) do planeta, é só a primeira, e a mais óbvia, de suas muitas peculiaridades.

Como uma amostra profunda do continente sul-americano, o Chile consegue juntar no mesmo mapa paisagens tão diferentes quanto o Deserto do Atacama, ao norte, considerado o mais seco do mundo, e as geleiras e fiordes da Patagônia, a um passo da Antártida. E ainda é capaz de unir esses contrastes com uma formidável fileira de montanhas que acompanha caprichosamente a forma longilínea do país - a Cordilheira dos Andes, seguida há 100 milhões de anos de um abrupto movimento da crosta terrestre, e que hoje continua sendo retocada pela natureza, como nos lembram os tremores de terra e as erupções vulcânicas que volta e meia acontecem por lá.


Banhado pelas águas geladas do Oceano Pacífico, o litoral chileno também é uma inesgotável (e saborosa) fonte de surpresas para nós - e vale a pena conferir isso numa feira de pescados, onde o impacto da descoberta é ainda maior do que num restaurante. Uma boa dica é visitar o mercado público de Santiago. Lá você vai encontrar mariscos de um palmo de comprimento (os choros zapatos), lagostões espinhudos (as centollas), algas arrumadas em fardos com alfafa (as ultes) e crustáceos estranhíssimos de crosta alta, cilíndrica, com uma pequena abertura de onde pendem garras inquietas. 



Ninguém pode deixar a capital chilena sem ao menos fazer um passeio a pé em torno da Plaza de Armas, no centro histórico. Na hora do almoço, a praça se enche de adolescentes tomando sorvete e de senhores que disputam um lugar no coreto pra jogar xadrez. Suba também até o Cerro Santa Lucia, o morro onde a cidade foi fundada, em 1541. Por causa de seus labirintos, o Cerro é o refúgio mais procurado pelos casais de namorados e desfruta, ainda, de uma vantagem preciosa, aparentemente sem explicação: não é tão vigiado pelos carbabineros. Vale a pena conferir esse território livre. Outra visita obrigatória é o Cerro San Cristobal, que oferece a melhor vista de Santiago (se puder, experimente o romântico funicular). O pôr-do-sol visto de San Cristobal só não é mais romântico por causa da poluição. 



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